O atendimento psicológico on-line: uma revisão sistemática da literatura

O atendimento psicológico on-line: uma revisão sistemática da literatura

Resenha com base no artigo “O atendimento psicológico on-line: uma revisão sistemática da literatura”, de João Leite Ferreira Neto & Charlisson Mendes Gonçalves. Publicado na Revista Foco em maio de 2023.

Por Juan Linhares da Mata* e José Newton Garcia de Araújo**

Resumo

Objetiva-se, com o presente artigo, discutir a experiência de trabalho nos atendimentos psicológicos on-line. Foi efetuado um levantamento das publicações que abordaram essa temática nas plataformas Portal Periódicos CAPES e PEPSIC. Além de artigos, foram incluídos documentos regulamentadores dessa prática. Observou-se as mudanças ocorridas ao longo do tempo na regulação dos atendimentos psicológicos, havendo necessidade dos profissionais se adaptarem à atual realidade da sociedade, bem como atentarem para o fato de que tais mudanças favoreceram a dinâmica e a praticidade do atendimento. As articulações teóricas mostram que o atendimento online se reveste de características diferenciadas da prática presencial e que o psicólogo deve sempre avaliar de forma cuidadosa o ambiente no qual as sessões ocorrerão, percebendo seu impacto no paciente e na eficácia, considerando os termos de segurança e privacidade para a intervenção. A literatura também discute a possibilidade de se implantar uma modalidade “híbrida” de atendimentos que transitaria entre encontros on-line presenciais.

Palavras-chaves: Psicologia; saúde; atendimento on-line; tecnologia.

A presente escrita tem como intuito realizar uma breve resenha acerca do artigo “O atendimento psicológico on-line: uma revisão sistemática da literatura”, escrita por Gonçalves & Ferreira Neto (2023), que tem como principal objetivo conhecer a experiência de trabalho nos atendimentos psicológicos on-line, bem como compreender se é possível um processo terapêutico, valendo-se de dispositivos tecnológicos. Trata-se de um estudo contemporâneo e que vem permeando a prática psicológica na atualidade, em grande parte por decorrência da doença coronavírus SARS-CoV-2, uma infecção respiratória que emergiu no início do ano de 2020 e acometeu a população mundial.

O estudo em questão versa, inicialmente, sobre uma perspectiva histórica e contextualiza as presentes transformações sociais, em suas diversas dimensões. Diante dessas mudanças, compreende-se que há um impacto na saúde mental de parte significativa da população. (SILVA; SANTOS; OLIVEIRA, 2020; FLORÊNCIO; VALE, 2020). Além disso, o isolamento social, decorrente da SARS-CoV-2, evidenciou, ainda mais, os impactos sanitários e psíquicos já vigentes na sociedade, ocasionando aí uma ampliação de atuação da Psicologia. Nesse aspecto, o atendimento psicoterapêutico on-line enfatizou a acessibilidade para aqueles que não desejam ou não podem comparecer ao atendimento presencial. Além disso, observa-se um refinamento dos procedimentos e metodologias para uma atuação psicológica ética advinda dos seus profissionais.

Ademais, tal cenário ocasionou o aumento na procura de atendimentos psicológicos, em virtude do caráter imprevisível, sem modos de prevenção e fora de controle do SARS-CoV-2. Com isso, houve a necessidade de adaptações, tanto da população quanto dos profissionais, no tocante ao isolamento social. Decorrente de tais necessidades, o atendimento psicológico se expandiu e consolidou-se, levando à prática permanente dos atendimentos psicológicos online, bem como ao seu aumento, para os profissionais que já o utilizavam em seu exercício profissional. Nesse contexto, os autores partem de um dado pressuposto, já levantado em outros estudos, de que havia profissionais com a utilização constante de atendimentos psicológicos, por meio de TICs (tecnologias de informação e comunicação), demonstrando o potencial e a eficácia desse procedimento. Contudo, compreende-se que houve dificuldades iniciais com diversas necessidades de adaptação dos profissionais, devido ao início abrupto e repentino do uso dessa tecnologia. Curiosamente, os autores do presente artigo relatam que a Psicologia já se inseria aos poucos nesse modo de atuação desde 1990, demonstrando o interesse prévio em sua utilização.

Em um segundo momento, o artigo resenhado apresenta como metodologia principal a utilização de registros de literatura acadêmica e documentos regulatórios do atendimento on-line como fonte primária para as discussões sobre a temática, além de recorrer a outros autores que versam sobre ela. O artigo em questão parte de uma perspectiva qualitativa e interpretativa proposta pelos autores. O levantamento de dados se deu por meio dos 20 trabalhos mais recentes que abordaram a temática proposta, observando-se a cronologia de publicação dos artigos, de modo sistematizado e gradativo, no tocante à inserção da Psicologia no contexto tecnológico.

Num momento seguinte, o estudo se debruça nos aspectos históricos dos atendimentos, bem como na necessidade descrita como “latente”, em caráter mundial, da emersão da terapia on-line. Nesse sentido, vislumbra-se que outros países já utilizam as TICs de forma ampla, há bastante tempo, nos atendimentos psicológicos, bem como de psicoterapias realizadas por meio de softwares e robôs, sendo a mais conhecida a denominada “Eliza, a psicanalista”, que é um robô. (OLIVEIRA, 2009; LEITE, 2016). Ademais, ressaltam, por meio de referências, a importância da postura ética, capacidade e certificação dos profissionais que operam as TICs, bem como o zelo perante o risco iminente da utilização destas na rotina profissional dos psicólogos(as), almejando sempre a utilização de plataformas seguras e que previnam o vazamento de dados, buscando minimizar os riscos de vazamentos de dados.

De igual modo, há uma contextualização no tocante às regulamentações existentes que possibilitaram a consolidação das pesquisas, orientações on-line e atendimentos psicológicos on-line, fruto da Resolução CFP nº 11/2018, que “pavimentou a estrada” para a atual realidade dessas práticas. Logo, compreende-se o papel fundamental de regularização e fiscalização do Conselho Federal de Psicologia (CFP), no tocante aos avanços profissionais e sociais, realizados nesse sentido pela Psicologia. O atendimento psicológico on-line possibilitou inovações nas intervenções e práticas específicas, assim como propiciou grande desenvolvimento profissional à profissão e aos profissionais da área, em prol da saúde mental e da acessibilidade aos serviços ofertados pelos profissionais de Psicologia.

Outra consideração anotada pelos autores se dá no tocante à relação terapêutica e ao espaço ocupado por psicólogo e paciente na terapia. Apesar do setting on-line, ocorre a criação de um espaço compartilhado, intermediado por um software e propiciador de uma comunicação virtual, que resulta na formação de uma presença real no ambiente virtual. Nesse aspecto, compreende-se que, apesar da não presença física, há uma presença real, como posta pelos autores, e esse fator é compreendido como fundamental no processo terapêutico, assim como na transferência estabelecida entre psicólogo e paciente. Diante disso, compreende-se que há uma nova formatação e estruturação a partir das necessidades emergentes do contexto social, no tocante à Psicologia contemporânea. Logo, torna-se papel do psicólogo favorecer a dinâmica e a praticidade do atendimento, na atualidade.
Como resultados, os autores vislumbraram que há aspectos diferenciais entre a Psicologia on-line e a Psicologia tradicional-presencial, principalmente em decorrência da ausência do corpo físico no atendimento, em um ambiente considerado estável, seguro e sigiloso. Ressalta-se a importância da privacidade e da continuidade, bem como a criação da maior estabilidade possível no setting terapêutico on-line, por meio de tecnologias seguras e regulamentadas. O ambiente é visto como fundamental para um bom processo terapêutico e eficácia de tratamento. A modalidade remota é vista como mais acessível, no aspecto financeiro e na acessibilidade dos encontros, durante o período pandêmico e para além dele. Há uma discussão sobre a implantação da modalidade “híbrida”, transitando entre on-line e presencial, de forma mais solidificada, nos dias atuais.

A eficácia do atendimento on-line, em comparação ao presencial, demonstra-se semelhante, apesar da não presença física. Todavia, compreende-se que tal eficácia se dá em decorrência da “presença real” descrita pelos autores nos atendimentos on-line. Por fim, infere-se que o tratamento psicológico on-line é uma importante ferramenta, atual e funcional, no labor psicológico, e criou grande expectativa de continuidade nos próximos anos, em decorrência de sua acessibilidade, eficácia e segurança.

Referências

GONÇALVES, Charlisson Mendes; FERREIRA NETO, João Leite. O atendimento psicológico on-line: uma revisão sistemática da literatura. Revista Foco, Curitiba (PR), v. 16, n. 5, e1723, p. 01-18, 2023. DOI 10.54751/revistafoco.v16n5-001. Disponível em: https://focopublicacoes.com.br/foco/article/view/1723. Acesso em: 19 maio 2023.

 

*Graduando em Psicologia na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC Minas, integrante do Grupo de Pesquisa: Psicologia, Trabalho e Processos Psicossociais – PsiTraPP / PUC Minas.

**Pós-doutor em Psicologia pelo Centre de Recherche Sens, Éthique et Société, CNRS / Université Paris-Descartes (2008) e coordenador do Grupo de Pesquisa: Psicologia, Trabalho e Processos Psicossociais – PsiTraPP / PUC Minas.

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