O discurso do empreendedorismo e inovação nas relações de trabalho: um estudo de Vagas Arrombadas

O discurso do empreendedorismo e inovação nas relações de trabalho: um estudo de Vagas Arrombadas

Por Luan Tannure Muschioni* e Bruno Márcio de Castro Reis**

Este texto é uma resenha crítica do artigo: “O discurso do empreendedorismo e inovação nas relações de trabalho: um estudo de Vagas Arrombadas”. Dentro da lente da psicologia organizacional é importante trazer o empreendedorismo e as transformações constantes das relações de trabalho à luz para reflexões, principalmente em um contexto de desemprego e insegurança no meio laboral, dessa forma, foi escolhido um artigo que contemplasse esse contexto. O trabalho traz reflexões acerca das novas relações de trabalho, a partir da análise do conteúdo de uma página de humor chamada “Vagas Arrombadas”, que possui contas no facebook, twitter e instagram.

O artigo é de autoria de Daniel Reis Silva, doutor e professor adjunto do departamento de comunicação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG); em parceria com Fábia Pereira Lima, doutora pela Universidade de São Paulo (USP) e também professora adjunta do departamento de comunicação social da UFMG. O trabalho alvo desta resenha foi publicado no segundo semestre de 2019 na revista ORGANICOM, número 31, ano 16, páginas 172 a 183, um períodico quadrimestral da aréa de Relações Públicas e Comunicação Organizacional, da Universidade de São Paulo.

As considerações feitas pelos autores são de grande valor para compreender a inovação das relações laborais e abrem espaço para a construção de conhecimentos que podem servir para alertar e proteger os trabalhadores do processo de precarização do trabalho contemporâneo. A partir da análise da página “Vagas Arrombadas”, que tem como objetivo satirizar vagas de emprego abusivas, os autores do texto criam, a partir de uma ferramenta de entretenimento, um trabalho de grande relevância para o atual cenário do mercado de trabalho.

O artigo critica o modo como, no modelo capitalista vigente, são propagados discursos neoliberais que fomentam a terceirização do trabalho, reduzindo o custo da força de trabalho e tornando suas condições mais precárias. No contexto da terceirização e do trabalho intermitente, o trabalhador fica à margem da proteção social, muitas vezes sujeito a longas jornadas, trabalho conforme demandas e informalidade.

Para sustentar a ideia de que o trabalhador que deve correr atrás de quem compre sua mão de obra terceirizada; são usados argumentos de base meritocrática, que o responsabilizam pela situação socioeconômica em que se encontra. Dessa forma, espera-se que o empregado se esforce além do necessário, a ideia de uma ascensão social e melhora na qualidade de vida, tal qual a vida dos grandes empreendedores que saíram da pobreza para o sucesso.

O artigo traz ainda a revisão das relações e ambientes tradicionais de trabalho, que deixam as atividades mais atraentes, por meio de elementos da cultura pop, investimento em espaços de lazer, mudanças nas formas de tratamento e o cultivo de um sentimento de pertencimento. “Ele precisa dar ‘tanto valor para a empresa quanto seus fundadores dão a ela, mesmo que você (ainda) não seja dono dela’ (vaga para uma start-up postada em agosto de 2017)”(SILVA; LIMA, 2019, p.180): Exemplo das vagas analisadas no artigo, onde é possível perceber o sentimentalismo exacerbado e a promessa vazia feita como processo de captura da subjetividade.

A forma com que essa página foi transformada pelos autores em uma ferramenta reflexão efetiva para o meio acadêmico também é um feito respeitável e mostra uma maneira de como o meio científico pode se beneficiar das redes  sociais como fonte de construção de material, tomando-se sempre os devidos cuidados com as fake news e deep fakes, dentre outras formas de manipulação de conteúdo digital.

Pode-se ressaltar ainda o valor dessa página de humor “Vagas Arrombadas”, que cria um espaço onde trabalhadores têm a possibilidade de analisar perfis de vagas e discutir sua procedência, servindo de certa forma como uma rede de apoio e conscientização. E a partir disso, o artigo se torna também uma espécie de denúncia, expondo a forma com que esse discurso age sobre a subjetividade do trabalhador induzindo-o à obediência aos valores e normas do capital, na esperança de alcançar o sucesso fetichizado.

Referências:

SILVA, Daniel Reis; LIMA, Fábia Pereira. O discurso do empreendedorismo e inovação nas relações de trabalho: um estudo de Vagas Arrombadas. Organicom, v. 16, n. 31, p. 172-183, 2019. Disponível em: < https://www.revistas.usp.br/
organicom/article/view/161101>. Acesso em: 12 maio de 2022.

*Estudante de psicologia na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC Minas, integrante do Grupo de Pesquisa: Psicologia, Trabalho e Processos Psicossociais – PsiTraPP / PUC Minas.

**Psicólogo, mestre em Ciências Sociais, doutorando em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Pesquisador no PsiTraPP – PUC Minas.

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