GESTÃO DA SUBJETIVIDADE NO TRABALHO: POSSÍVEIS IMPACTOS DOS ALGORITMOS SOBRE A ATIVIDADE

GESTÃO DA SUBJETIVIDADE NO TRABALHO: POSSÍVEIS IMPACTOS DOS ALGORITMOS SOBRE A ATIVIDADE

O presente trabalho propõe-se a realizar uma breve resenha do artigo intitulado “Gestão da subjetividade no trabalho: possíveis impactos dos algoritmos sobre a atividade”, escrito pelos autores Rafael Soares Mariano Costa e Rodrigo Padrini Monteiro (2023). Publicado na Pista: Periódico Interdisciplinar  em fev./jun. de 2023.

Por Thaís da Silva Almeida* e Carlos Eduardo Carrusca Vieira**

Resumo

O texto “Gestão da subjetividade no trabalho: possíveis impactos dos algoritmos sobre a atividade” é uma análise crítica sobre as transformações digitais e como elas afetam a subjetividade no trabalho. Os autores exploram a complexa dinâmica entre os algoritmos e a subjetividade no contexto da revolução digital, destacando como as tecnologias emergentes estão moldando não apenas os processos de trabalho, mas também a forma como os indivíduos se percebem e se relacionam com suas atividades laborais. O estudo recorre a uma extensa revisão da literatura e análises críticas, lançando luz sobre as questões éticas e psicológicas que surgem à medida que a influência dos algoritmos continua a se expandir. 

Palavras-chave: Transformação digital. Algoritmos. Subjetivação no trabalho. Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs).

O artigo busca explorar a complexa dinâmica entre os algoritmos e a subjetividade no contexto da revolução digital, destacando como as tecnologias emergentes estão moldando não apenas os processos de trabalho, mas também a forma como os indivíduos se percebem e se relacionam com suas atividades laborais. Para atingir esse objetivo, o estudo recorre a uma extensa revisão da literatura e análises críticas, lançando luz sobre as questões éticas e psicológicas que surgem à medida que a influência dos algoritmos continua a se expandir (SCHWAB, 2016).

Primeiramente, os autores abordam a gestão da subjetividade no ambiente de trabalho e exploram os efeitos potenciais dos algoritmos nesse cenário. Eles enfatizam que a transição para uma organização digital do trabalho vai além da simples digitalização de tarefas; ela engloba transformações abrangentes nas esferas política, econômica, social e individual. Os autores também apontam para as Revoluções Industriais como marcos cruciais que moldaram a sociedade ocidental e reconfiguraram a dinâmica de produção. (NICOLACI-DA-COSTA, 2002). Eles indicam a importância de examinar a forma como práticas específicas evoluíram ao longo de diferentes períodos históricos para entender de forma mais completa os impactos das novas tecnologias nos processos de subjetivação no contexto laboral.

No que diz respeito a “Dimensões da Gestão Algorítmica na Vida e no Trabalho”, os autores apontam como os algoritmos são poderosas ferramentas que podem conhecer e influenciar nossas ações, até mesmo aquelas que consideramos mais pessoais. Eles são usados para prever comportamentos e resolver problemas de forma precisa. Segundo o texto, essa tecnologia está mudando a maneira como gerenciamos a realidade, tanto em nossa vida diária quanto no trabalho. (ANTUNES, 2018; CARELLI; CAVALCANTI; FONSECA, 2020; HARARI, 2016). A lógica subjacente a esse modelo de gestão algorítmica – o controle – é uma característica central que pode ser observada em diferentes ambientes de trabalho.

Além disso, os algoritmos desempenham um papel importante, definido por Fuchs e Sevignani (2013) como “economia afetiva”, uma vez que o uso de dispositivos como redes sociais, computadores e telefones vai além das tarefas operacionais, envolvendo interações emocionais e sociais que influenciam a experiência dos usuários. Por exemplo, o botão “curtir” reflete nossas reações emocionais. Embora, em teoria, os conteúdos sejam acessíveis por qualquer pessoa nas plataformas, na prática, sua visualização é direcionada pelas estratégias econômicas das empresas que detêm o controle sobre as redes sociais. Isso significa que o que vemos e acessamos nessas plataformas é influenciado por motivações econômicas, como argumentado por Fuchs e Sevignani (2013) e Nicolacida-Costa (2005). Essa percepção é fundamental para entender como o trabalho digital e como as emoções desempenham um papel na economia. À medida que nossas atividades se tornam mais digitais, nossos dados se tornam um produto valioso. Isso cria valor, principalmente na forma de publicidade, a partir de trabalho não remunerado, já que a maioria das redes sociais não nos cobra pelo uso de seus serviços (FUCHS; SEVIGNANI, 2013). Quando você interage em redes sociais, os algoritmos usam seus dados para fornecer informações e anúncios baseados em seus interesses. Isso cria um ciclo, pois quanto mais você usa a rede social, mais anúncios direcionados você vê, criados com base em seus padrões de uso.

A partir da discussão do artigo os autores apontam que as tecnologias de computadores e celulares permitem registrar as ações dos trabalhadores de forma automatizada. Isso não apenas coordena suas tarefas, mas também as torna mais eficientes, do ponto de vista dos empregadores, com o objetivo de aumentar a produtividade geral (AMORIM; MODA, 2020). Essa lógica dos algoritmos está ligada ao discurso neoliberal, que questiona o papel do Estado na proteção dos direitos e argumenta que as práticas de trabalho devem ser menos regulamentadas. É importante notar que os algoritmos não são neutros, e as informações que eles selecionam são moldadas pelas lógicas de produção. Isso é fundamental para entender as limitações do discurso de autonomia e independência oferecido por essas plataformas. Pesquisas, como as de Huws (2019), sugerem que esse funcionamento das plataformas cria um ciclo de dependência para os trabalhadores, que ficam presos em condições precárias e perpetuam esse sistema.

Ainda na discussão os autores abordam a “gestão algorítmica do trabalho,” a partir do autor Adams-Prassl (2020) que destaca o amplo uso de algoritmos e inteligência artificial em empresas. Essas tecnologias desempenham um papel crucial em várias etapas do processo de trabalho, desde a contratação de funcionários até a gestão e, em alguns casos, a demissão. Os funcionários agora estão sujeitos a um monitoramento constante, onde suas ações, como digitar, fazer chamadas telefônicas, enviar e-mails e capturar telas, são registradas. Esses dados são então processados por algoritmos em constante aprendizado, que podem influenciar muitos aspectos do trabalho, desde a atribuição de tarefas até a remuneração. No entanto, esse controle algorítmico muitas vezes carece de transparência, com os trabalhadores tendo pouco conhecimento sobre como essas decisões são tomadas (Adams-Prassl, 2020).

A Psicologia, como ciência e profissão, não está imune a essas transformações. As Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) impactaram significativamente a atuação dos psicólogos. O afastamento das questões sociais, muitas vezes influenciado pela distância proporcionada pelas TICs, pode comprometer a qualidade do atendimento psicológico, um fenômeno descrito como “atrofia da profissão.” (Araújo et al., 2021). Essas questões desafiam a Psicologia a se adaptar e contribuir de maneira significativa no enfrentamento dos impactos negativos dessa nova era do trabalho.

Os autores recorrem ainda ao conceito de “capitalismo flexível”, debatido por Sennett (2015), que foca na flexibilização do trabalho e na economia de curto prazo. As implicações pessoais dessas novas formas de controle no trabalho, muitas vezes relacionadas à precarização, resultam em complexos processos de subjetivação. Vivenciamos uma “sociedade do esgotamento”, onde a exploração de nós mesmos nos torna vítimas e algozes de nossa própria capacidade. A racionalidade algorítmica e o neoliberalismo acentuam desigualdades e a precarização do trabalho, mas também abrem espaço para a exploração de alternativas e movimentos de resistência, como “Break the apps” e outras novas organizações sindicais. Nesse cenário, os autores finalizam com indagações cruciais acerca de como o uso de algoritmos na gestão do trabalho está reconfigurando as experiências dos trabalhadores, influenciando a regulamentação do trabalho e redefinindo o significado do trabalho. E apontam que também precisamos considerar os possíveis efeitos na saúde dos trabalhadores decorrentes dessa vigilância constante e da dissolução das fronteiras entre a esfera profissional e a pessoal, e, portanto, como psicólogos do trabalho, nosso papel é contribuir para lidar com as consequências adversas dessas mudanças, visando à proteção e promoção da saúde dos trabalhadores.

Por fim, a partir da leitura desse texto é possível concluir que a relação entre tecnologia, trabalho e subjetividade é complexa e multifacetada. A introdução crescente de algoritmos e tecnologias digitais nos locais de trabalho tem mudado radicalmente a forma como as atividades são organizadas e realizadas. Essas mudanças têm impactos profundos na subjetividade dos trabalhadores, influenciando suas relações com o trabalho e com os outros. É evidente que as transformações tecnológicas e a implementação de algoritmos não são neutras, mas carregam implicações significativas para a organização do trabalho e para a economia em geral. A compreensão desses impactos e a busca por soluções para os desafios decorrentes desse novo paradigma tecnológico requerem um esforço conjunto de pesquisadores, profissionais, trabalhadores e legisladores. Questões cruciais surgem, como a necessidade de regulamentação e transparência na implementação de algoritmos no ambiente de trabalho, a proteção da privacidade dos trabalhadores, a garantia de condições dignas de trabalho em um cenário de crescente flexibilização e precarização, e a reflexão sobre a natureza do próprio trabalho.

A psicologia do trabalho desempenha um papel vital ao explorar e compreender as complexas dinâmicas entre tecnologia, trabalho e subjetividade. Ela pode contribuir para o desenvolvimento de estratégias que visam proteger e promover a saúde mental e emocional dos trabalhadores, bem como apoiar a construção de alternativas aos modelos de gestão algorítmica que perpetuam desigualdades e precarização. Em última análise, diante das profundas mudanças no mundo do trabalho que a revolução tecnológica nos trás, a psicologia do trabalho e os profissionais dessa área desempenham um papel fundamental na busca por soluções que garantam que ninguém fique para trás em termos de condições de trabalho dignas e sustentáveis. O futuro do trabalho é incerto, mas com compreensão, pesquisa e ação colaborativa, podemos moldá-lo de maneira a preservar o bem-estar dos trabalhadores e promover uma sociedade mais justa e equitativa.

Referências

COSTA, Rafael Soares Mariano; MONTEIRO, Rodrigo Padrini. Gestão da Subjetividade no Trabalho: Possíveis Impactos dos Algoritmos sobre a Atividade. Periódico Interdisciplinar, Belo Horizonte, v. 5, n. 1, p. 27-39, fev./jun. 2023.

 

*Graduanda em Psicologia na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC Minas, integrante do Grupo de Pesquisa: Psicologia, Trabalho e Processos Psicossociais – PsiTraPP / PUC Minas.
**Pós-doutor em Psicologia pela PUC Minas e integrante do Grupo de Pesquisa: Psicologia, Trabalho e Processos Psicossociais – PsiTraPP / PUC Minas.

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