Recentemente, o Conselho Regional de Psicologia de Minas Gerais (CRP-MG) publicou o primeiro número de sua revista, que “pretende oferecer à categoria de psicólogas(os) mais um canal de informação e reflexão sobre as pautas importantes e urgentes da profissão”. A publicação terá periodicidade semestral e vai trazer reportagens, colunas, artigos e entrevistas sobre o fazer psi e suas interseções.
Neste primeiro número, a Revista do CRP-MG trouxe uma excelente entrevista com a Doutora em Psicologia e Professora do Instituto de Psicologia da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Maristela Pereira, intitulada “Quando o trabalho produz adoecimento”. A partir de sua experiência como psicóloga organizacional e posteriormente como professora e pesquisadora, Maristela discute os reflexos do adoecimento na subjetividade de trabalhadores e trabalhadoras e a responsabilidade da Psicologia nesse campo.
A professora explica que a perspectiva da Saúde do Trabalhador enxerga o adoecimento como um processo sócio-histórico: “o sujeito adoece essencialmente pela forma de inserção no mundo produtivo. Por isso, devem ser pensadas intervenções não apenas sobre o indivíduo, mas nas formas de organização do trabalho” (p.6).
Contudo, observamos que as empresas adotam muitas práticas no sentido de a pessoa praticar atividades físicas, ter uma alimentação saudável, reduzir o consumo de álcool e parar de fumar, por exemplo, como se isso fosse promover ou garantir a saúde no trabalho, deixando de lado mudanças no contexto laboral. Na opinião de Maristela, “nesse cenário, é como se a culpa pelo adoecimento fosse do sujeito, e ele é abandonado à própria mercê depois de instalada a patologia” (p.9).
Outro ponto discutido pela pesquisadora é a dificuldade em reconhecer o nexo causal entre o adoecimento mental e o trabalho. Se no casos de adoecimento físico esse nexo já costuma ser de complexa caracterização, no caso de adoecimentos psíquicos a tarefa é ainda mais delicada. Para ela, essa tarefa compreende “um esforço hercúleo e que demanda tempo”.
Por fim, Maristela fala sobre a repercussão dos novos modos de produção e de trabalho, indicando que “novas configurações de trabalho geram novas modalidades de adoecimento”. A pesquisadora cita como o surgimento de novas tecnologias criam novos regimes de trabalho, porém trazem consigo um refinamento das estratégias de captura do sujeito e “uma borragem das fronteiras entre o tempo de trabalho e de não trabalho”, como nos casos de home office ou mesmo do acesso ao indivíduo em tempo integral, mesmo em seus momentos de lazer.
A entrevista completa está disponível no site do CRP-MG: https://crp04.org.br/noticias/revista-crp-minas-gerais/
São referências de leitura deixadas pela entrevistada:
Lima, M. E. A.; Assunção, A. A.; Francisco, J. M. S. D (2010). Aprisionado pelos ponteiros do relógio: o caso de um transtorno mental desencadeado no trabalho. In: Jacques, M. G. & Codo, W. (Orgs.). Saúde Mental e Trabalho: Leituras. Petrópolis: Vozes.
Pereira, M. S. (2017). Trabalho, vida e adoecimento: as múltiplas faces da violência contra trabalhadores. In: C. A. FERNANDES. (org.). A violência na contemporaneidade, do simbólico ao letal. (pp. 85-111) São Paulo: Intermeios.
Seligmann-Silva, E. (2011). Trabalho e desgaste mental: o direito de ser dono de si mesmo. São Paulo: Cortez.
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