Ergonomia da Atividade aplicada à Qualidade de Vida no Trabalho: lugar, importância e contribuição da Análise Ergonômica do Trabalho (AET)

Ergonomia da Atividade aplicada à Qualidade de Vida no Trabalho: lugar, importância e contribuição da Análise Ergonômica do Trabalho (AET)

Por Ana Tereza Netto Viana* e Rodrigo Padrini Monteiro**

Resumo: Introdução: o método clássico da Ergonomia da Atividade, a Análise Ergonômica do Trabalho (AET), consolidou-se no campo das ciências do trabalho como um instrumento eficaz para operacionalizar a perspectiva de compreender o trabalho para transformá-lo. Objetivo: o artigo relata uma experiência de uso heterodoxo da AET situando seu papel instrumental no nível analítico micro ergonômico da abordagem intitulada “Ergonomia da Atividade Aplicada à Qualidade de Vida no Trabalho (EAA_QVT)”. Método: a análise de demanda específica – ponto de partida da AET –, proveniente de dirigentes, gestores e técnicos no contexto do serviço publico brasileiro, está na gênese da construção dessa abordagem que articula a Ergonomia da Atividade e a Qualidade de Vida no Trabalho (QVT). Resultados: com base na apresentação panorâmica dos fundamentos teóricos e metodológicos da EAA_QVT, busca-se ilustrar a aplicação singular da AET, situando o seu lugar, a sua importância e sua contribuição como recurso instrumental imprescindível para uma avaliação mais profunda dos fatores que impactam na QVT nas organizações. Conclusão: os resultados produzidos pela aplicação da EAA_QVT possibilitam gerar recomendações para as atividades de vigilância, assistência e promoção da saúde e segurança no trabalho.

Palavras-chave: ergonomia da atividade; análise ergonômica do trabalho; qualidade de vida no trabalho.

O presente texto constitui uma resenha do artigo intitulado “Ergonomia da Atividade aplicada à Qualidade de Vida no Trabalho: lugar, importância e contribuição da Análise Ergonômica do Trabalho (AET)”, com autoria de Mário César Ferreira, da Universidade de Brasília, Brasília, DF.

O texto busca expor as possibilidades de análise da qualidade de vida no trabalho com a abordagem EAA_QVT (Ergonomia da Atividade Aplicada à Qualidade de Vida no Trabalho). Nesse sentido, é colocado o porquê da necessidade de tal ferramenta, em que contexto ela surge, trazendo também quais os seus objetivos e como utilizá-la, além de demonstrar sua eficácia em um estudo realizado dentro de um órgão publico federal. Vale ressaltar que a técnica exposta aparece para contribuir com a Análise Ergonômica do Trabalho, bem como utiliza de uma perspectiva micro e macro em sua obtenção de resultados.

Primeiramente, faz-se indispensável entender a gênese da EAA_QVT. Considera-se que os sujeitos estão inseridos em um contexto globalizado e tecnológico em que o trabalho passa por transformações aceleradas e intensas, o que tem produzido indicadores negativos para a saúde do trabalhador, tais como o crescimento dos casos de síndrome de Burnout e aumento dos acidentes de trabalho (FERREIRA, 2015). Dessa forma, nascem as aplicações da AET, as ciências do trabalho e da saúde são convocadas para compreender as mudanças que ocorrem, bem como para identificar os problemas trazido por elas e sugerir soluções para tais.

Em segundo lugar, é de extrema importância citar os fundamentos teóricos e metodológicos acerca da abordagem EAA_QVT. Essa técnica coloca em conjunto os fundamentos da QVT, que consistem em compensar os desgastes vivenciados pelos trabalhadores, com a base da ergonomia, que tem como objetivo adaptar o trabalho ao ser humano. Sendo assim, trabalhado com a QVT, faz-se necessário olhar para duas dimensões interdependentes: a ótica das organizações e a ótica dos trabalhadores que, respectivamente, colocam a necessidade dessa abordagem de estar entre as normas organizacionais, promovendo o desenvolvimento do ambiente de trabalho e como representação global, trazendo experiências de bem-estar no âmbito profissional. É a partir dessas dimensões que o modelo EAA_QVT se estrutura, trazendo em seus níveis analíticos as questões macro e micro ergonômicas.

O nível macro ergonômico é o primeiro nível analítico. Ele é o ponto de partida para um diagnóstico organizacional que visa responder a seguinte pergunta: “Como promover a QVT para todos os servidores de um dado órgão público?”. Dessa forma, os trabalhadores expressam como se sentem no ambiente de trabalho, com as modalidades de bem-estar e mal-estar. Tais modalidades foram definidas por Ferreira (2015):

O bem-estar no trabalho é um sentimento agradável que se origina das situações vivenciadas pelo(s) indivíduo(s) na execução das tarefas. A manifestação individual ou coletiva do bem-estar no trabalho se caracteriza pela vivência de sentimentos (isolados ou associados) que ocorrem, com maior frequência, nas seguintes modalidades: alegria, amizade, ânimo, confiança, conforto, disposição, equidade, equilíbrio, estima, felicidade, harmonia, justiça, liberdade, prazer, respeito, satisfação, segurança, simpatia (FERREIRA, 2012a, p. 179);

O mal-estar no trabalho é um sentimento desagradável que se origina das situações vivenciadas pelo(s) indivíduo(s) na execução das tarefas. A manifestação individual ou coletiva do mal-estar no trabalho se caracteriza pela vivência de sentimentos (isolados ou associados) que ocorrem, com maior frequência, nas seguintes modalidades: aborrecimento, antipatia, aversão, constrangimento, contrariedade, decepção, desânimo, desconforto, descontentamento, desrespeito, embaraço, incômodo, indisposição, menosprezo, ofensa, perturbação, repulsa, tédio (FERREIRA, 2012a, p. 180).

Pode-se definir que o nível macro ergonômico de análise também é responsável por investigar as condições do trabalho, a organização do trabalho, as relações socioprofissionais do trabalho, o reconhecimento e crescimento profissional e o elo entre trabalho e vida social, haja vista que esses pontos são considerados fatores estruturantes do bem-estar e mal-estar no ambiente profissional. Ademais, é nessa fase que se utiliza da ferramenta IA-QVT, um instrumento de análise quantitativa e qualitativa com o objetivo de mapear outras questões, fazendo o uso de um método rápido, eficaz e com rigor científico.

No que se diz respeito ao diagnóstico micro ergonômico, o primeiro passo é mapear o Custo Humano do Trabalho (CHT). Para a EAA_QVT, esse índice apresenta três caraterísticas principais, sendo elas, respectivamente: ser imposto externamente aos trabalhadores, ser gerido por meio de estratégias de mediação individual e coletiva, e, por fim, estar na origem das produções de representações mentais de bem-estar e mal-estar. Após esse mapeamento, coloca-se na lupa da AET os resultados obtidos, a fim de entender como os trabalhadores conseguem regular as exigências presentes no âmbito profissional, além de investigar como esses servidores lidam com os múltiplos constrangimentos advindos dessa atividade.

De acordo com Ferreira (2015), é possível afirmar de forma metafórica que: “o diagnóstico macro ergonômico mostra a ponta do iceberg e o diagnostico micro ergonômico permite conhecer o que está na base desse mesmo iceberg” (Ferreira, 2015, p.24). Agora que esclarecemos como a análise a partir da EAA_QVT funciona, é trazido um exemplo prático da maneira de aplicar essa abordagem.

Realizada em um órgão publico federal brasileiro, 520 trabalhadores participaram desse diagnóstico e estavam presentes no momento da coleta de dados. De acordo com os resultados obtidos nessa pesquisa, dois aspectos se colocaram em destaque: a cobrança excessiva no prazo de cumprimentos de tarefas e as tarefas repetitivas, sendo esses, dessa maneira, potencializadores do mal-estar no trabalho.

Conclui-se, portanto, que o uso da ferramenta EAA_QVT, embora revele seus limites, pode vir a ser uma alternativa para a produção de conhecimento sobre QVT. É preciso também ampliar o uso dessa abordagem para outros lugares além do Brasil e para fora do setor público, além de serem necessários ajustes teóricos dessa abordagem para que ele consiga superar os seus limites. Ademais, é indispensável concordar que a AET pode ser uma forte aliada para melhor compreendermos as causas do bem-estar e mal-estar vivenciados por trabalhadores em seus âmbitos profissionais.

 

Referências:

Ferreira, Mário César. Ergonomia da Atividade aplicada à Qualidade de Vida no Trabalho: lugar, importância e contribuição da Análise Ergonômica do Trabalho (AET). Revista Brasileira de Saúde Ocupacional [online]. 2015, v. 40, n. 131 [Acessado 18 Abril 2022] , pp. 18-29. Disponível em: https://doi.org/10.1590/0303-7657000074413. ISSN 0303-7657.

*Ana Tereza Netto Viana é Bolsista de iniciação cientifica PsiTraPP, estudante de psicologia do 7º período na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC Minas / Coração Eucarístico.

**Rodrigo Padrini Monteiro é psicólogo e doutor em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC Minas e membro do núcleo de pesquisa em Psicologia, Trabalho e Processos Psicossociais – PsiTraPP.

 

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